Monitorização remota do caudal fornece aviso prévio de inundações
Deixamos aqui uma entrevista dada por Jonathan Gourley (investigador principal da ANCHOR, hidrologista do Laboratório Nacional de Tempestades Severas do NOAA) à R&D Magazine sobre a importância da monitorização remota do caudal para o fornecimento de avisos prévios de inundações. Neste caso prático os caudalímetros de radar RQ e de método de diluição TQ da Sommer forneceram dados importantíssimos. Saiba mais:
Caudalímetro Radar RQ |
Medição do Caudal em Rios - método de diluição |
Durante uma inundação, o aviso prévio é a chave para reduzir os danos e garantir a segurança. No entanto, os caudalímetros convencionais - que são atualmente utilizados para monitorizar rios e prever as próximas inundações podem ser dispendiosos e de exigente manutenção. Além disso, os equipamentos são muitas vezes arrastados durante as inundações, resultando na perda de um equipamento valioso.
Pesquisadores do Laboratório Nacional de Tempestades Severas do NOAA estão a trabalhar para melhorar a monitorização do caudal com o projeto Automated Non-Contact Hydrologic Observations in Rivers (ANCHOR).
O projeto está focado em três tecnologias sem contacto para melhorar as capacidades de observação e monitorização em rios: radar para medição de caudal, deteção ótica (LIDAR) e radar interferométrico (ISRadar). A porção do projeto de medição de caudal por radar é atualmente a mais robusta, e em 14 locais, em todo o território dos Estados Unidos, já estão a ser instalados sensores remotos que usam a tecnologia Doppler através de radar para medir velocidade, nível e caudal em rios. As instalações foram efetuadas ao longo de 2017, com resultados esperados até meados de 2018.
Esta tecnologia, usada em combinação com alertas de texto e notificações, tem potencial para ter um impacto significativo nas práticas de gestão de recursos hídricos e ajudar a reduzir os danos e lesões que ocorrem devido a inundações.
Para saber mais sobre o projeto, a revista R&D falou com o investigador principal da ANCHOR Jonathan J. Gourley, hidrologista do Laboratório Nacional de Tempestades Severas do NOAA.
R&D Magazine: Qual é o objetivo do projeto ANCHOR?
Gourley: Eu vejo uma revolução, ou pelo menos uma evolução, necessária na hidrologia em termos de métodos de observação. Quando entrei pela primeira vez no campo da hidrologia, as pessoas ainda falavam na precipitação ao longo da bacia hidrográfica. Para estudar uma bacia, instalava-se uma série de pluviómetros ao longo da mesma, sendo a precipitação a média dos pluviómetros, ao longo de um determinado período de tempo. Com a minha experiência no radar meteorológico, isso não fazia o menor sentido. Sabemos que há precipitação que varia espacialmente ao longo da bacia e podemos ver isso com o radar meteorológico. Eu tinha visto coisas semelhantes acontecerem em outras observações hidrológicas tais como humidade do solo, profundidade do lençol freático e caudal.
O caudal é outra variável que tem sido medida com um medidor convencional – que é análogo a um pluviómetro. Os medidores de caudal existem à décadas. Ocorreu-nos que talvez pudéssemos usar alguns sensores de monitorização remota para estimar as propriedades dos rios, que seriam interessantes e melhorariam o nosso conhecimento e a nossa base de pesquisa, e poderiam ser incorporadas em modelos e fazer um melhor trabalho de previsão de caudais.
R&D Magazine: Quais são os maiores benefícios da monitorização remota comparativamente à medição convencional?
Gourley: Temos um projeto que nos permitiu adquirir um equipamento que nos fornece duas informações, ambas através da tecnologia de radar. Uma delas é o nível do rio, que é a altura ou a profundidade da água. A segunda informação é a velocidade da água à superfície.
O benefício é que o sensor não está em contacto com a água. Um medidor de caudal convencional usa ou um poço de estabilização com um dispositivo flutuador, ou o que é chamado de transdutor de pressão – neste caso existe um pequeno tubo até ao fundo da água, medindo a altura da água com base na pressão. Como este instrumento está em contacto com a água, acontece frequentemente que, quando ocorre uma inundação, o equipamento é levado com a água. A vantagem das tecnologias de medição sem contacto é que os equipamentos podem ser montados em segurança, acima do nível máximo do rio, não havendo o risco de serem perdidos. Além disso, no mundo de hoje em dia, podemos começar a pensar em coloca-los em drones e pilotá-los ao longo do rio, para obter assim a distribuição real da velocidade no rio conforme subimos ou descemos. Estas são formas de obtermos muitos mais detalhes, comparando com a medição num ponto.
Outro benefício é o custo. Os sensores atuais têm praticamente o mesmo custo, comparativamente à aquisição e instalação de um medidor convencional. A maior diferença está na operação e manutenção de um sistema convencional. Um medidor convencional não mede a velocidade, apenas mede o nível do rio. Os técnicos hidrológicos têm que visitar cada local de medição várias vezes durante o ano, sob diferentes condições, para desenvolverem o que é denominado por “Curva de caudal”. Uma curva de caudal é uma relação simples entre a profundidade do rio e o caudal medido. Basicamente os técnicos têm que ir aos locais e medir o caudal manualmente, várias vezes por ano, para irem atualizando a curva de caudal. O medidor de caudal está a medir o nível a cada 15 minutos, então eles usam a curva de caudal como uma tabela de consulta e dizem “Ok, tenho um nível de oito pés” e então usam a tabela para fornecer a estimativa de caudal. A atualização desta curva é muito dispendiosa pois é necessário pagar pelo trabalho das pessoas que vão fazer as medições com alguma frequência.
No nosso caso, com o sistema de radar que nos mede tanto o nível como a velocidade, quando vais ao local e deixas lá o equipamento, imediatamente tens o caudal. Não é necessário estabelecer uma curva de caudal e continuar atualizando-a. Esta é a grande vantagem deste tipo de solução.
R&D Magazine: De que forma o sistema de medição por radar mede a velocidade?
Gourley: O radar está a apontar para um ponto que não é diretamente em baixo do sensor; está a olhar um pouco para montante ou um pouco para jusante. O sensor utiliza o princípio Doppler e, através deste, analisa as pequenas ondulações à superfície da água, que se movem consoante a velocidade. Desta análise, além de perceber qual o sentido do fluxo, o sensor calcula também a sua velocidade.
R&D Magazine: Estes sensores de radar estão atualmente distribuídos por 14 locais. Como foram selecionadas estas localizações?
Gourley: Tivemos vários critérios que entraram nesse processo de seleção e ainda estamos a procurar outros locais. Em alguns locais os nossos sensores estão co-localizados com medidores convencionais, que já existiam, para fins comparativos. Isto é algo que precisamos de fazer para justificar a validade dos instrumentos.
Também tentamos encontrar áreas que são conhecidas como áreas de inundação rápida e que ainda não foram avaliadas por medidores de caudal convencionais, que são tipicamente operados pelo United States Geologic Survey. Trabalhamos com várias entidades locais, desde serviços meteorológicos, estados, universidades, e tentamos encontrar lugares que sejam reincidentes para inundações repentinas. Normalmente, estes sistemas são projetados para locais de dimensões menores, pois os rios maiores como o Mississippi, o Ohio, o Colorado, geralmente já estão bem calibrados com medidores de caudal convencionais. Não queremos duplicar muitos esforços. Na maioria das vezes, tentamos encontrar lugares que ainda não estão monitorizados.
R&D Magazine: Quem pode aceder às informações desses sensores?
Gourley: Eles são todos transmitidos em tempo real, é feito o upload e ficam acessíveis ao público. Para cada um dos locais, trabalhamos com as partes interessadas locais e estabelecemos limites. Se a velocidade do fluxo exceder certos limites e eles quiserem saber quando isso acontece, podemos programar um contacto móvel para receber uma notificação quando esses limites forem excedidos. A partir desse momento, também aumenta a frequência na qual a velocidade é medida e em que os dados são transmitidos. O sistema adapta-se às condições hidrológicas.
R&D Magazine: Porque é que é tão importante monitorizar com precisão a velocidade dos rios?
Gourley: Eu posso-vos fornecer um exemplo dessa importância. O nosso primeiro local foi Falls Creek, em Oklahoma, perto do campo de Falls Creek, uma área que tem muitos visitantes. Estabelecemos os limites para alarmes e passados dois meses de termos instalado a instrumentação, ocorreram condições climáticas severas no local. No meu telemóvel começaram a ser recebidas as informações sobre a ultrapassagem dos limites em Falls Creek. Eu tinha o meu portátil comigo e comecei a procurar outros produtos - sensores de chuva, equipamentos para previsão de inundações - para ter a certeza de que não era falso alarme. Com certeza que estavam a cair chuvas intensas e que os avisos eram reais. Mandei uma mensagem para o nosso contacto lá – a empresa local encarregada de monitorizar as condições e garantir que os participantes estão em segurança – para que ele soubesse que as condições climatéricas se estavam a deteriorar e que estávamos a começar a receber alertas do nosso sistema de radar.
Uma coisa que foi interessante de verificar, foi que a velocidade do rio aumentou pelo menos uma hora antes de começarmos a ver o aumento no nível do rio. Isso deu-lhes uma hora de antecedência. Nós estávamos a começar a ver o aumento da velocidade e isso significava que era provável que a subida do rio se seguiria, o que poderia resultar no rio a transbordar as margens e causar alguns danos. A instrumentação estava a montante do acampamento e eles tinham um aviso prévio. Nós estávamos trocar mensagens de texto durante todo o evento climático, e a última que ele me enviou foi "Está tudo bem aqui, obrigado". Então, o facto de termos recebido alguns alertas antecipados foi extremamente importante. Eu posso imaginar uma série de áreas em outros lugares onde isto seria útil.
Fontes:
https://www.rdmag.com/article/2017/09/remote-sensing-streamflow-radar-provides-advance-warning-flooding
https://eos.org/editors-vox/in-pursuit-of-flash-flood-data